Valores, continuidade e trabalho em equipe: os segredos do sucesso do Fluminense em Xerém

Tricolor é um dos clubes que mais utiliza jovens formados na base em todas as temporadas e vê em Xerém a solução do presente e do futuro

Fluminense campeão brasileiro sub-17
Fluminense venceu o Athletico-PR para sagrar-se campeão do Brasileirão Sub-17 (Foto Mailson Santana / FFC)

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Respeito, espírito de equipe, comprometimento, criatividade e meritocracia são os valores que uma das maiores fábricas de jogadores do Brasil leva para a formação dos atletas. A base do Fluminense, de onde saíram nomes como Thiago Silva, Marcelo, Carlos Alberto, Fabinho e Roger, é, cada vez mais, uma válvula de escape para o clube. Não só pelo quesito financeiro, com vendas anuais de nomes de destaque, mas também no âmbito esportivo. Em 2020, o Flu foi uma das equipes que mais utilizou atletas "da casa" no time profissional, com 21. E Xerém não fornece apenas para o profissional. O Tricolor é o atual campeão brasileiro no Sub-17 e disputa as quartas de final da competição nacional no Sub-20.

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Como explicar o sucesso em Xerém? Para Antônio Garcia, diretor executivo da base do Fluminense, o maior motivo para a formação de joias todos os anos está na ideia implantada pelo clube e na continuidade dos jogadores e dos profissionais envolvidos na formação. Em entrevista exclusiva ao LANCE!, o dirigente explicou o que o Flu faz de diferente.

- O grande diferencial do Fluminense é a metodologia, a cultura. O processo de continuidade dentro do clube. Os atletas chegam muito jovens, com cinco, seis anos no futsal. Com 10 fazem a transição para o campo. Quando chega no Sub-17 ou no Sub-18 tem atletas com nove ou 10 anos de treinamento. Alguns até com mais. Esse processo de continuidade é importante, até nos profissionais. Temos alguns com mais de 20 anos no clube que continuam se atualizando com o que é desenvolvido no futebol mundial. Esse trabalho com muitas mãos, com uma visão sistêmica do que é o futebol hoje, conseguimos ter bastante êxito na formação e construção dos atletas. Não formamos só atletas, mas cidadãos, seres humanos - disse André.

VEJA A TABELA DO CAMPEONATO BRASILEIRO

O CT Vale das Laranjeiras, casa da base tricolor em Xerém, Duque de Caxias, começou a ser operado efetivamente em 1999. O terreno possui uma área de mais de 120 mil m², com sete campos, academia, dormitório para 90 atletas, sala de psicologia, nutrição, departamento de fisiologia, entre outros, o clube investiu pesado na infraestrutura do local, especialmente na última década. Mas a formação está longe de ser apenas no âmbito esportivo. Para o Fluminense, um dos pilares mais importante está no lema "faça uma pessoa melhor, que você terá um jogador melhor".

- Não é só um formador de atleta, forma cidadãos, homens, pessoas de caráter e de bem. Nossas equipes multidisciplinares têm a responsabilidade e preocupação de abastecer esses atletas com o maior número de informações sobre a sociedade, o que acontece no mundo. Tentar prepará-los de alguma forma para a vida e para que tenham um futuro, caso tenham uma frustração com o futebol, para que estejam prontos para seguir a vida como cidadãos e pessoas de bem. Faz parte do nosso compromisso. Quando a família entrega um atleta para nós, na nossa confiança, temos a responsabilidade de fazer que esse menino melhore. Temos valores que trabalhamos diariamente em Xerém respeito, espírito de equipe, comprometimento, criatividade e meritocracia. Levamos isso muito a sério dentro do clube e eles carregam para o resto da vida. A cada dia mais estamos tentando fazer com que eles evoluam - explicou.

CT Vale das Laranjeiras - Fluminense
CT Vale das Laranjeiras (Foto: Mailson Santana/Fluminense FC)

PRESENÇA CONSTANTE 

A crise financeira vivida pelo Fluminense nos últimos anos aumentou a importância de se utilizar jogadores formados na base. Neste ano, com a maratona de partidas, os surtos de Covid-19 e a necessidade pelo elenco curto, o Tricolor relacionou diversos atletas de Xerém, utilizando 21 deles. Vários ganharam mais espaço logo em sua primeira temporada no profissional, como Calegari e Luiz Henrique.

- É comum. O Fluminense tem o histórico de utilizar muitos atletas da base no profissional, é um clube que oportuniza bastante. O atleta de Xerém está na raiz e na cultura do Fluminense que ele seja usado no time principal. A torcida espera sempre que a base esteja produzindo novos craques. Em virtude do calendário apertado deste ano no profissional, com muitas competições e pouco intervalo entre os jogos, a contaminação de atletas pela Covid-19, acabou dando mais oportunidades aos jovens - analisou André Garcia.

- O projeto do Sub-23, tocado pelo Paulo Angioni (diretor de futebol do Fluminense) também foi importante para criar mais espaço para a base, para que estejam cada vez mais próximos do profissional. Foi importante para a nossa formação aqui, para a continuidade do processo. É um trabalho multidisciplinar, psicossocial, que trabalha com a parte psicológica dos atletas para que eles estejam aptos a enfrentar adversidades, a cobrança. É um trabalho realizado por muitas mãos, não só pela comissão técnica em campo, mas de muitas áreas envolvidas na formação e formatação desses meninos para que se tornem grandes atletas - completou.

Já nesta nova safra de jogadores, os de maior destaque em 2020 foram Arthur, meia de 15 anos que treinará com o profissional quando completar 16, John Kennedy, atacante de 18 anos, Samuel, atacante de 20 anos, Kayky, atacante de 17 anos, Metinho, volante de 17 anos, Marcos Pedro, lateral-esquerdo de 19 anos, Gabryel Martins, atacante de 18 anos, entre outros.

Fluminense x Athletico-PR - Sub-17
Fluminense foi campeão Sub-17 (Foto: MAILSON SANTANA/FLUMINENSE FC)

O ANO EM XERÉM

A temporada de 2020 acabou interrompida pela pandemia da Covid-19. Assim como aconteceu com o time profissional, o Fluminense também precisou desenvolver um trabalho específico para a base. Neste ano, o Tricolor foi campeão do Sul-americano Conmebol Sub-13 e do Campeonato Brasileiro Sub-17, título inédito de uma das gerações mais promissoras da história do clube. Neste momento, a categoria Sub-20 disputa as quartas de final do Brasileirão e o Sub-17 as quartas da Copa do Brasil.

 - Foi um ano difícil para os clubes e a população mundial. Como nossa psicóloga costuma dizer, não existe ninguém experiente em pandemia. Foi uma novidade para todos. Tivemos nossas dificuldades, mas com muita criatividade nós conseguimos vencer os desafios, fazer com que os atletas evoluíssem cognitivamente diante da distância. Fizemos muito trabalho da inteligência de jogo, da nossa metodologia. Fazer com que os atletas entendessem os conceitos de jogo, até coisas que tínhamos mais dificuldade de trabalhar no dia a dia em virtude da quantidade de jogos, do excesso de compromissos, e evoluímos bem com isso. O resultado em campo foi muito bom, essa conquista do Brasileiro Sub-17. Antes da pandemia tínhamos conquistado a Conmebol Sub-13. Estamos no Brasileiro Sub-20, Copa do Brasil Sub-17. Então o Fluminense teve bastante êxito - analisou Antônio Garcia.

Xerém segue a mesma metodologia para todas as categorias, diferenciando o trabalho para cada faixa etária, respeitando a fase de desenvolvimento de cada atleta.

RELEMBRE QUEM JÁ SAIU

O Fluminense soma quase R$ 300 milhões em vendas de jogadores ao longo desta década. Em 2020, as saídas foram de Evanilson ao Porto (POR), que o Tricolor tinha direito a 30% (R$ 13,5 milhões) do valor, e Marcelo Pitaluga ao Liverpool (ING), onde o clube vai receber € 1 milhão (cerca de R$ 6,2 milhões), com mais € 1 milhão se o goleiro atingir todas as metas previstas no contrato.

Em 2019, Pedro, vendido à Fiorentina (ITA) rendeu R$ 36,5 milhões ao Flu e Roger Ibañez deu R$ 17,2 milhões após sair para a Atalanta (ITA). No ano anterior, Ayrton Lucas (R$ 15,3 milhões) foi para o Spartak Moscou (RUS), João Pedro (até R$ 46 milhões) ao Watford (ING), Douglas (R$ 4,6 milhões) ao Corinthians e Léo (R$ 3 milhões) ao São Paulo foram as fontes de renda.

Outros nomes de destaque foram Wendel, vendido ao Sporting (POR) em 2017 por um lucro de R$ 23,3 milhões, Gerson, que saiu para a Roma (ITA) em 2016 rendendo R$ 45 milhões, e Kenedy, vendido ao Chelsea (ING) por R$ 17 milhões.

Desde 2015, primeiro ano sem a Unimed, a melhor colocação do Fluminense no Campeonato Brasileiro foi o 12º lugar, em 2018, quando acabou escapando do rebaixamento apenas na última rodada. Nesse período, foram 12 vendas de atletas feitas para a Europa. Dentre os criados em Xerém, Marcelo Pitaluga, Evanilson, Pedro, João Pedro, Ibañez, Ayrton Lucas, Marlon, Wendel, Gerson e Kenedy. Além deles, Gilberto e Richarlison, que chegaram já nos profissionais, também entram na lista. O clube embolsou cerca de R$ 300 milhões nessas vendas, mas, em comparação com o que o Flamengo recebeu apenas com Vinicius Júnior e Lucas Paquetá (terceira e sexta maiores vendas do futebol brasileiro), o Rubro-Negro embolsou cerca de R$ 314 milhões.

Isso mostra que o Flu, apesar de produzir muitas joias, acaba tendo que vender por menos do que poderia pela necessidade financeira. Os dois atletas vistos como maior possibilidade de retorno neste momento são os atacantes Marcos Paulo e Luiz Henrique.

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