MP de Temer é o fim do Ministério do Esporte, projetam entidades

Transferência de verba das loterias federais do setor para a segurança pública revolta atletas e organizações, que já sofriam com perda de recursos após os megaeventos <br>

Temer e Leandro Cruz
Michel Temer empossou Leandro Cruz no Ministério do Esporte, em abril. Pasta terá perda (Foto: Francisco Medeiros)

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A decisão do presidente Michel Temer de editar, na última segunda-feira, a Medida Provisória 841, com o objetivo de transferir parte dos recursos das loterias esportivas para a segurança pública, caiu como uma bomba e preocupa diversos setores do esporte, tanto de alto rendimento quanto o escolar, que já sofriam com cortes após os anos gloriosos dos megaeventos no país. Algumas entidades projetam que o ato marca o fim do Ministério do Esporte.

O dinheiro das loterias tem sido fundamental para viabilizar as iniciativas do Comitê Olímpico do Brasil (COB), do Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB), do Ministério e do Comitê Brasileiro de Clubes (CBC). O governo afirmou, ao lançar o Fundo Nacional de Segurança Pública, que projetos sociais seriam mantidos, mas a versão é contestada por organizações que lidam com o tema.

– É uma falácia dizer que eles vão tirar uma sobra de dinheiro dos megaeventos. As secretarias perderão R$ 200 milhões. Não é só o alto rendimento. Se você diminui dessa forma o recurso, inviabiliza outros setores. Na prática, é como se estivessem acabando com a pasta – disse Louise Bezerra, diretora da ONG Atletas pelo Brasil, ao LANCE!.

O segmento vem se mobilizando contra o texto atual da MP. Até então, 4,5% da arrecadação bruta das loterias eram destinados ao Ministério do Esporte, que ficava com parte do valor e repassava outra ao Comitê Brasileiro de Clubes e secretarias estaduais de esporte.

Pela Lei Agnelo Piva, eram repassados 2,7% da arrecadação, dos quais 1,7% ficavam com o COB e 1% com o CPB. Agora, as as entidades terão graves perdas. A medida, decretada em caráter de urgência, ainda passará pelo Congresso Nacional.

As perdas para o Ministério do Esporte são estimadas em R$ 500 milhões. A pasta levou cerca de R$ 600 milhões da verba das loterias em 2017. Para o alto rendimento, os números ainda não são certos, mas diversos projetos com foco nos Jogos Pan-Americanos de Lima (PER), em 2019, e nos Jogos Olímpicos de Tóquio (JAP), em 2010, estão ameaçados.

– Estamos falando de verba que iria para ONGs, para a educação. Tem as competições escolares e universitárias. O esporte todo está nessa roubada. Tirar esse orçamento do Ministério é fechar a pasta, pois desmonta o esporte em todos os setores – afirmou a ex-jogadora de vôlei Ana Moser, presidente do Instituto Esporte & Educação.

O ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, afirmou que a estimativa é que a pasta receba R$ 800 milhões a mais neste ano com os repasses de recursos de loterias.

As principais entidades esportivas do país, entre elas o COB e o CBC, repudiaram a decisão. Elas reclamam que a medida passou por cima da Comissão do Esporte da Câmara, que vinha debatendo mudanças na distribuição da verba das loterias. ONGs, clubes e esporte universitário perderam tudo.

– Nossa visão é de que somos atores não reconhecidos ainda no sistema, ou somos de uma maneira pouco representativa. É preciso construir um novo modelo e travar uma luta. Mas, agora, o foco é lutar por recursos para o esporte, independentemente de para quem ele será repassado. Demos as mãos. Nós, ONGs, o COB, o CBC e outras entidades estamos mobilizados – falou Ana Moser.

Na segunda-feira, o COB, o CBC e outras entidades já haviam se manifestado. Elas lembraram que o Brasil já convive com a falta de uma política esportiva e afirmaram que "a redução prevista na Medida Provisória do pouco que hoje é investido nos esportes educacional, de rendimento e de participação, em alguns anos ocasionará um aumento ainda maior nos já alarmantes índices de violência do país".

Ministro viaja para Europa e afirma: "Esporte ficou para escanteio"

Em meio ao caos para a comunidade esportiva devido aos impactos da MP 821, o ministro do Esporte, Leandro Cruz, cumpriu agenda na Europa nesta terça-feira. Ao fim do dia, emitiu uma nota criticando a decisão do presidente. 

"O Ministério do Esporte tem plena consciência da crise na segurança pública que tem afetado a vida dos brasileiros. É muito claro para todos nós que essa é uma área que merece receber investimentos urgentes e prioritários do Poder Público. Mas nunca em detrimento do esporte, sabidamente um forte aliado no combate à violência. Não podemos concordar com a decisão de retirar recursos como os direcionados aos clubes formadores de atletas olímpicos e paralímpicos e às entidades que fomentam o esporte escolar e universitário. Modificar a legislação que regula a distribuição de verbas das loterias não ajuda a resolver o problema. É essencial a compreensão de uma união de ações em favor da segurança, cada setor com suas estratégias. E o esporte é uma ferramenta poderosa. Queremos continuar dando nossa contribuição, mas, ao inviabilizar as fontes de financiamento de vários setores esportivos, a Medida Provisória editada na última segunda-feira coloca o esporte para escanteio. Ela atinge não só o esporte de alto rendimento, mas principalmente a prática esportiva como política educacional. Estamos unidos a toda a comunidade esportiva e faremos tudo para reverter essa situação. Vamos lutar, junto ao Governo, para modificar a MP durante sua tramitação no Congresso Nacional e assegurar a manutenção do financiamento do sistema desportivo brasileiro. O esporte é uma ferramenta fundamental de desenvolvimento social e não pode ser prejudicado por uma legislação que joga contra todos os brasileiros". disse Leandro Cruz.

A pasta informou que ele se encontraria com autoridades de Portugal e participaria do lançamento do Programa Clube Top, que oferecerá aos dirigentes de 10 mil clubes portugueses ferramentas de gestão das estruturas de base.

Atletas se manifestam

As Comissões de Atletas do vôlei e vôlei de praia emitiram uma carta aberta pedindo o fim da MP, assinada pelos presidentes e ex-jogadores André Heller e Emanuel. 

“A revogação imediata da Medida Provisória editada é imprescindível, sob pena de se afetar, em curto espaço de tempo, a formação de atletas no país, resultando, fatalmente, no fim do Esporte Brasileiro que, como sabido, representa, inclusive, mecanismo eficaz no combate à violência social”, afirmaram os atletas na carta.

COM A PALAVRA

Louise Bezerra
Diretora executiva da Atletas pelo Brasil

Estamos falando do esporte, mas há outras perdas relacionadas ao direito social, à educação e à cultura com essa medida. É algo que a gente repudia totalmente. O governo não consultou o setor. Foi feito competente de cima para baixo, sem nenhuma avaliação de impacto.

O governo tem tomado medidas não em benefício da sociedade, mas eleitoreiras. Este é um caso muito claro. A Comissão do Esporte da Câmara estudava um Projeto de Lei que redistribui os recursos da Lei Agnelo-Piva. Ele vinha sendo debatido por entidades, com participação. Tudo foi ignorado.

Atualizado às 19h35, com a posição do ministro Leandro Cruz.

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