Cairo Santos revela interesse da NFL no Brasil e sonho de jogar no país

Primeiro e único brasileiro a disputar a liga americana, kicker fala ao L! sobre carreira, crescimento do futebol americano no Brasil e expectativa para a temporada

Cairo Santos chuta field goal na vitória sobre o Houston Texans, no último sábado (Foto: AFP)
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A história de Cairo Santos poderia ter sido completamente diferente. Inicialmente com o sonho de ser jogador de futebol, assim como vários jovens no Brasil, ele viu seu futuro mudar completamente após um intercâmbio para os Estados Unidos. Depois de ser convencido por amigos, ele trocou a bola redonda pela oval do futebol americano e acabou se tornando o primeiro brasileiro a atuar na NFL. Como kicker, ele é o responsável por chutar a bola nos field goals (durante o jogo) e extra points (após o touchdown).

- Me dá muito orgulho ver o tanto que o esporte cresce no Brasil. Desde que eu estava na faculdade já vinha vendo isso e nesse últimos anos ainda mais. Tive a oportunidade de representar o país na NFL, fazer projetos como embaixador, esse ano estou fazendo a segunda edição do meu Camp, em São Paulo. Estou muito animado de ver os torcedores indo para sessões de autógrafo, entrevistas, o carinho vem sendo muito grande - disse Cairo, em entrevista ao LANCE!. 

O primeiro ano não foi fácil para ele, que chegou a receber um ultimato do técnico Andy Reid após alguns erros consecutivos. No entanto, depois de aprender a conviver com a pressão do esporte, Cairo se consolidou como um dos destaques da liga e anotou 129 pontos nos últimos três anos. Hoje, inclusive, ele se tornou embaixador do esporte no Brasil e, de contrato renovado com o Chiefs, espera crescer cada vez mais.

- Seria um sonho jogar no Brasil o esporte que me apaixonei. Ajudar a trazer para cá e possivelmente jogar no Maracanã, Mineirão, algum estádio ícone do país. Seria uma das minhas maiores alegrias - comentou ele, que fará a estreia na temporada regular contra o New England Patriots, no dia 7 de setembro. 

VEJA A ENTREVISTA NA ÍNTEGRA: 

O esporte tem crescido muito no Brasil. Como você vê isso e o aumento no número de fãs?


Me dá muito orgulho ver o tanto que o esporte cresce no Brasil. Desde que eu estava na faculdade já vinha vendo isso e nesse últimos anos ainda mais. Tive a oportunidade de representar o país na NFL, fazer projetos como embaixador, esse ano estou fazendo a segunda edição do meu Camp, em São Paulo. Estou muito animado de ver os torcedores indo para sessões de autógrafo, entrevistas, o carinho vem sendo muito grande.

Quero só retribuir e junto com a NFL. Trazer a liga para mais perto do Brasil, outros jogadores de lá. Acho que estamos no caminho certo. Todos estão no caminho certo para fazer com que o futebol americano seja um esporte mais tradicional. Tem algumas dificuldades ainda, pois a prioridade no Brasil é o futebol, mas quanto mais conseguimos mostrar o quanto a cultura do futebol americano é legal, mais fácil de crescer.

Muitos falam sobre a possibilidade da NFL trazer um jogo para o Brasil. Você vê essa chance grande? Como seria jogar aqui?

O dono do Chiefs, Clark Hunt, é um dos representantes internacionais entre os donos das 32 franquias. O Brasil é um tópico de conversa todo ano, como podemos expandir. Ainda temos algumas dificuldades. Economia, questão de visto, são as coisas que já ouvi eles discutirem. Mas o interesse está ali. Eles estão trabalhando para fazer isso acontecer, mas isso que é o legal. O Brasil já ter mostrado para os donos, televisões e patrocinadores que já é o terceiro maior mercado do mundo. É o esporte que mais cresce no país. Agora é fazer acontecer. Espero poder ajudar nisso.

Seria um sonho jogar no Brasil o esporte que me apaixonei. Ajudar a trazer para cá e possivelmente jogar no Maracanã, Mineirão, algum estádio ícone do país. Seria uma das minhas maiores alegrias.

No seu primeiro ano, você chegou a receber um ultimato do treinador pelos erros e hoje vive ótimo momento. Como foi essa transição e como se sente hoje?

No começo tive que competir com o veterano deles, o Ryan Succop, durante quatro meses. Ganhei a vaga e nos dois primeiros jogos eu acertei um chute e errei o outro e perdemos. Com isso, o Andy Reid me cobrou e disse que era a última chance de jogar bem. Foi um momento marcante. Senti a realidade da pressão que era jogar na NFL, onde só tem um kicker por elenco. A cobrança é altíssima.

Como é a relação hoje com o treinador?

Em um desses treinos de pressão que estava fazendo, eu tinha que entrar em campo e dar o chute da vitória. Quando acertei, ele me chamou de "Money" (dinheiro, em inglês). É uma expressão que as pessoas usam para um jogador que define na hora que precisa mais, que não erra e pode contar. Se tivesse que apostar nele, ganharia dinheiro.

Teve um outro dia, em uma situação parecida, que eu acertei e ele falou "dinheiro", em português. Achei muito legal. Ele gosta de conhecer os jogadores, brincar. Me senti parte da equipe. Isso me deu confiança e auto-estima, por ser reconhecido por ele como um cara em que ele pode apostar.

Quais foram e são os maiores desafios de jogar no Chiefs? O clima das cidades atrapalha nos chutes?

Quando comecei, a maior dificuldade era largar o futebol. Praticando o futebol americano, eu ainda saía de um treino e ia para o outro. O maior problema foi mudar o chute, porque antes fazia um chute mais rasteiro, colocado, com efeito. E depois precisava "isolar" a bola, chutar o mais longe possível. Tinha que ser mais controlado e mais técnico.

Hoje, o maior desafio é o clima. O tempo, o vento, a grama. Esses são os maiores problemas que senti da faculdade para a NFL, onde os estádios são maiores e os ciclos de vento diferentes. Cada estádio tem um jeito diferente, tenho que ver se preciso mirar de um lado ou de outro por causa do vento, adaptar à grama. Isso com certeza é o que mais preciso estudar.

Como funcionam os treinamentos e como você se prepara para uma partida, inclusive na parte psicológica?

Nós treinamos três vezes por semana e tento controlar a quantidade de chutes para não chegar no jogo sem energia ou força. Prezo mais a qualidade do que a quantidade. Sempre faço treinos de 30 field goals e 10 kick offs. Os técnicos colocam situações nos treinamentos em que o jogo está empatado e precisamos acertar um chute para ganhar. No treino já sinto a pressão de todos me assistindo e me cobrando. Eles querem sentir confiança em você no treino para ter certeza que podem te colocar no jogo.

No começo me afetou essa responsabilidade. Mas depois daquela semana eu acertei tudo por um bom tempo, inclusive chutes de vitória. A porcentagem igualou a melhor de um calouro. Isso me deu mais confiança. Hoje em dia não tem mais aquela competição, sinto que a vaga é minha e sou o jogador que eles querem. Fico cada vez mais com moral e sendo respeitado, não só no time, mas na liga.

Você foi sondado por outras equipes antes de renovar com o Chiefs? Como foi a decisão de permanecer em Kansas?


Tiveram alguns times interessados, mas nenhuma oferta chegou. Eu disse para o meu empresário que meu interesse era ficar. Os outros times sabiam disso e que para me tirar de lá precisariam fazer uma proposta grande. No fim, deu certo. Quero mesmo ficar em Kansas City. Estou feliz de ficar pelo menos um ano no mesmo time.

Os Chiefs tiveram mudanças para essa temporada. Acha que dá para manter o nível? Como você vê a nova dinâmica da equipe?

Acredito que vão ter muitas novidades. Os times especiais podem ser nosso diferencial. A novidade vai ser no ataque. Não temos mais o Jamaal Charles (que foi para o Denver Broncos), o Jeremy Maclin (agora no Baltimore Ravens), que foram duas armas ofensivas. Mas tem uma galera muito dinâmica, mais jovem. O Tyreek Hill, que surgiu ano passado como um dos jogadores mais rápidos da liga e vai estar mais envolvido.

Sua estreia será contra o Patriots. Como está a expectativa?

Já é um jogo de playoffs para nós. Nos treinos e reuniões já temos aquela mentalidade de chegar com um ponto de exclamação para cima dos atuais campeões e na casa deles. Para mostrar que o Chiefs vai brigar por Super Bowl esse ano. Estamos usando essa oportunidade para mostrar que merecemos ser escolhidos pela NFL para esse jogo de abertura. Isso dá uma moral e confiança enorme. Queremos mostrar que não ganhamos essa vaga porque somos grandes de mercado de pequeno, mas que conseguimos chegar por méritos.

Qual a expectativa para a briga dentro da divisão e pelos playoffs?

Desde que o Derek Carr chegou, os Raiders vêm competindo como um time grande, como era antigamente. Hoje estão entre as melhores equipes e brigaram com a gente até o final pelo título da decisão. Com a chegada do Marshawn Lynch (que estava no Seattle Seahawks, se aposentou em 2016, mas retornou neste ano) fica ainda mais forte. O Broncos também está sempre na briga e o Chargers está em ascensão. Vai ser uma divisão apertada e uma conferência difícil de disputar. Estamos com a segunda tabela mais difícil da NFL. Todos os times da AFC estão crescendo e disputando como times grandes.

Você serve como inspiração para muitos que querem seguir essa carreira. Como é essa responsabilidade?

Primeiramente quero cuidar da minha carreira. Cada ano que consigo jogar na NFL é uma conquista enorme. Quero me assegurar cada vez mais lá e partir para esse projeto que tenho de incentivar outros jogadores aqui e fazer o rumo que fiz. Fazer um intercâmbio nos Estados Unidos, praticar o esporte lá. Assim que abrimos as portas para chegar onde eu cheguei. E também fazendo clínicas, tendo acesso a equipamentos e tudo mais. O futebol americano hoje me deu uma carreira, mas antes de tudo me deu um diploma, uma educação.

Você começou no futebol americano por acaso. Como foi essa decisão de ficar no esporte?

Fui para os Estados Unidos inicialmente para fazer um ano de intercâmbio e jogar o nosso futebol e quando cheguei já entrei em um time. Depois de uns dois meses, uns amigos conheceram minha habilidade no chute e me convenceram a fazer um teste para ser o kicker. Na época eu não sabia nada sobre futebol americano, sabia que era um dos esportes mais populares, ia assistir aos jogos sem entender e falava que não queria jogar para não me machucar. Porém, me convenceram, dizendo que só entraria para chutar.

Fiz o teste e o técnico falou que eu estava no time, que tinha um chute muito bom e poderia até ganhar bolsa para a faculdade. Foi ali que percebi uma vontade de ficar nos Estados Unidos por mais dois anos na high school e continuar no futebol americano para conseguir a bolsa.

Você é torcedor do Flamengo. Como começou isso? Consegue acompanhar o time durante o ano?

Quase todos os meus amigos eram flamenguistas e isso incentivou minha paixão de torcer para o Flamengo. Lembro de jogos marcantes, como aquele gol do Petkovic contra o Vasco, de falta, em 2001. É um dos momentos que eu lembro de falar "poxa, eu amo o Flamengo". Consigo acompanhar mais de longe, toda semana estou vendo Brasileirão e Copa do Brasil. Quando estou no Brasil, não perco um jogo. Marco um churrasco com os amigos para ver. Uma das melhores coisas de voltar é isso, acompanhar mais de perto e ouvir a narração. Isso me traz muitas lembranças. As vezes consigo comprar um jogo que tem nos EUA, mas a narração dá saudade. Futebol ainda é minha primeira paixão.

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