Grana de chinês, relações confusas… O ‘lado obscuro’ da tragédia da Chape

Documentário produzido pela 'CNN en Español' mostra novos fatos sobre a queda do avião da LaMia na Colômbia. LANCE! conversa com jornalista que conduziu investigações

Avião - Chapecoense
(Foto: Raul Arboleda/AFP)

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Um ano e seis meses depois, a tragédia com o voo da Chapecoense na Colômbia tem novos fatos revelados. O documentário "Chapecoense: o lado obscuro da tragédia", produzido pela "CNN en Español" (CNNE), mostra aspectos até então inéditos da queda do avião da boliviana LaMia. Uma equipe de jornalistas – liderada pelo correspondente espanhol Francho Barón – realizou uma longa investigação por mais de um ano em seis países. O filme, de uma hora e nove minutos, revela o uso de dinheiro de empresário chinês na manutenção dos aviões da LaMia - inclusive o que foi utilizado com a Chape - e detalha a influência do empresário venezuelano Ricardo Albacete sob os rumos da LaMia - o que poderia colocá-lo como responsável pela empresa, e consequentemente, responsabilizado pela tragédia que matou 71 pessoas.

O documentário será transmitido pela primeira vez em diversos países da América Latina neste fim de semana. No Brasil, ele vai para o ar nesta sexta-feira, às 20h, no Esporte Interativo. Na CNNE, o mesmo documentário vai ao ar no domingo, dia 10, também às 20h. No filme, Gustavo Vargas Gamboa, ex-militar da Força Aérea boliviana e diretor-geral da LaMia, diz em depoimento que Ricardo Albacete era mais do que um "simples arrendatário" da aeronave que caiu. Gamboa chegou a ser preso em regime fechado no fim de 2016, porém foi colocado em prisão domiciliar em julho do ano passado por só ter um rim funcional e precisar de insulina diariamente. Já Albacete jamais foi apontado pelas investigações como um dos responsáveis pela queda do avião.

Há a hipótese de que Albacete poderia ser o verdadeiro dono da LaMia, papel que oficialmente era exercido por duas pessoas: Miguel Quiroga, piloto do avião e morto no episódio, e o também piloto Marco Antonio Rocha Venegas, que fugiu da Bolívia após a tragédia e foi ilegalmente para os Estados Unidos, onde foi preso em janeiro deste ano. Além do depoimento de Gamboa sobre a possível relevância de Ricardo Albacete, o documentário mostra que a filha Loredana Albacete assinou faturas de cobrança enviadas à Chapecoense se identificando como diretora da companhia aérea. Ricardo, por sua vez, também dá entrevista no documentário e nega ser acionista da LaMia.

- No documentário, a gente coloca sequencialmente uma série de fatos, apoiados em documentos, e depoimentos de pessoas. Pode ser que ele (Ricardo) seja o administrador, de fato, e no filme, sequencialmente após uma apresentação de documentos, um professor de direito fala: "Se esse conjunto de elementos probatórios realmente é sólido, então ele (Ricardo) pode ser considerado como administrador, de fato, e ser responsabilizado pelo acidente. Evidentemente, não somos nós que devemos chegar a essa conclusão. É a Justiça que deve dizer isso. A única coisa que a CNNE fez foi colocar elementos juntos e mostrar um conjunto probatório - diz o jornalista Francho Barón, em entrevista ao LANCE!, em seguida explicando o formato do documentário:

- Estivemos em muitos países. Muitas fontes, centenas de documentos. Evidentemente, há perguntas que não foram respondidas, pois estamos falando de uma investigação complexa. Porém, pela primeira vez, mostramos um conjunto probatório importante. Se você assiste o documentário, ele deixa a porta aberta ao próprio publico para chegar a determinadas conclusões. A nossa responsabilidade, como jornalista, é fazer uma exposição de dados, como fizemos. Não entramos a especular nenhum milímetro. Só tem a exposição de fatos conseguidos através de fontes, confirmações e documentos.

Francho
Francho foi a Chapecó para colher depoimentos (Imagem: Reprodução)

DINHEIRO DE CHINÊS

O documentário também joga luz em um personagem até então escondido na história da LaMia: o empresário chinês Sam Pa. O asiático é amigo de Ricardo Albacete e o próprio venezuelano admite isso. A CNNE teve acesso a dois pagamentos de Sam Pa a Albacete, entre 2014 e 2015, no total de 2,7 milhões de dólares. Albacete admite que o dinheiro foi utilizado na manutenção dos aviões da LaMia, mas nega que o chinês tenha vínculo com a empresa. Albacete alega que era um adiantamento pela compra dos quatro aviões da LaMia, que seriam usados por Sam Pa para a abertura de duas companhias aéreas na África. No entanto, Albacete afirma que a intenção de abrir as companhias foi abortada quando Sam Pa acabou preso na China - por fomentar a corrupção de altos funcionários no Zimbábue através de negócio ilícitos com diamantes.

- Ele (Ricardo) disse que o dinheiro fazia parte de um acordo pela compra de quatro aviões, que Sam Pa queria fundar duas companhias na África: uma em Madagascar e outra em Serra Leoa. Teve o dinheiro do chinês, sim. Foi transferido para Albacete, sim. Ele nos disse que pegou esse dinheiro e gastou nas aeronaves. Agora, é a justiça que fará a avaliação disso - comenta Francho.

O documentário também mostra imagens inéditas de outra viagem da Chapecoense com a LaMia, na primeira vez que clube e empresa firmaram contrato. Foi no transporte para o jogo contra o Junior Barranquilla, pelas quartas de final da Copa Sul-Americana de 2016, em outubro. A delegação precisou fazer partes do percurso por terra - inclusive em uma van sem porta - por conta de limitações da LaMia. A ida de Chapecó para Barranquilla, que em condições de voo normais é feita em oito horas, foi realizada em 24 horas. Há também fotos de outras delegações voando com a LaMia e documentos sobre a ausência da cobertura de seguro para a LaMia na Colômbia, fatos já noticiados antes, mas pouco aprofundados até o documentário da CNNE.

- O barato do documentário é que muitas coisas sobre as quais muitos veículos especularam durante tempos, pela primeira vez passaram de ser boatos para ser fatos apoiados em documentos e depoimentos - destaca Francho, que pretende seguir com as investigações mesmo tendo fechado o documentário:

- Para mim, é como dizem: "Enquanto houver bambu, lá vai flecha". Enquanto, tiver bambu, a gente vai continuar trabalhando, sim. Com a divulgação do documentário, é bem provável que abram novas linhas de investigações. Tomara que sim. Isso aí é um desejo pessoal, mais do que qualquer outra coisa.

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